Como o início de construção
trouxe um novo alento a todos que já haviam se radicado por aqui. A
construção demorou uns três anos, pois em 1956, sabendo que o então
presidente Juscelino Kubitschek de Oliveira iria inaugurá-la, decidiram
vários daqui de Xavantina, participar de ato tão importante para o
desenvolvimento da região. |
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Uma
jardineira, veículo de transporte dos integrantes da Expedição
Roncador-Xingu.
Apesar do
período se chuvoso, pois era mês de fevereiro, João de Deus e Maria Rosa,
juntamente com mais alguns companheiros, iniciaram a viagem de Xavantina a Barra
do Garças.
Em cima da
carroceria de um pequeno caminhão que dava apoio aos trabalhos da base, o grupo
de pioneiros voltava a trilhar o caminho que um dia fora aberto pelas suas
próprias mãos. O momento era muito importante e significativo, isso sabiam
todos.
Pois aqueles que em cima daquela caminhão, em clima de festa, enfrentando
os 150 quilômetros de uma estrada cheia de acidentes e de pinguelas perigosas,
um dia sonharam em ver estas terras povoadas, o progresso tomando conta de tudo,
e esse acontecimento era o selo definitivo que uniria a região ao resto do
Brasil. Era a certeza de que seus sonhos estavam se tornando realidade.
Não é preciso
dizer da satisfação de todos em ter bem perto deles o presidente que
representava a redenção do Centro-Oeste brasileiro.
Foi promessa
de sua campanha presidencial transferir a capital do Brasil, do Rio de Janeiro
para um local não muito longe daqui, lá para os lados da cidade de Goiânia. Esse
era o comentário geral com o qual ele já tinha tido contato nas vezes anteriores
que esteve em Goiânia.
O fato é que
com a ponte que estava sendo inaugurada, novos melhoramentos viriam para a
região.
A ligação
terrestre entre Aragarças e as cidades de Iporá e Goiânia ficavam melhores. Já
se podia fazer o percurso com apenas um dia de viagem. Isso tudo representava o
progresso tão sonhado por todos que viviam para além do Araguaia.
O ÍNDIO E O
BRANCO
Outro
episódio que marcou muito a todos nesse ano de 1954, foi a casamento de Aires
Câmara da Cunha, membro da expedição, com a filha do chefe dos Calapalo, a índia
Diacuí.
Foi um grande
acontecimento, pois ela foi levada ao Rio de Janeiro, conheceu todos os hábitos
e costumes dos brancos. Como era uma índia bonita, onde ia, causava sensação.
Era uma verdadeira badalação.
O casamento
dos dois se realizou com todas as pompas, na Igreja da Candelária, numa festa
que foi muito falada por aqui. Esse casamento simbolizava a integração entre os
brancos e índios.
Pena que
tenha terminado de maneira tão trágica.
Ela esperava
o primeiro filho do casal. Mas não resistiu ao parto que se complicou e ela veio
a falecer. Foi um triste acontecimento para todos que esperavam ver nos rebentos
desse casamento a consolidação da integração das raças.
Em 1957
chegaram notícias aqui em Xavantina que a nova capital do Brasil começava a ser
construída. Brasília já era uma realidade. O presidente prometeu inaugurar a
nova capital ainda em seu governo, e isso seria até o ano de 1961.
Desenhava-se
na cabeça de João de Deus uma nova aventura. Conhecer o local da nova capital do
país.
Voltando a
Xavantina a idéia de ir até onde estava sendo construída a nova capital passou a
fazer parte de seu dia a dia.
Conversou
animadamente com Maria Rosa e decidiram que assim que pudessem, iriam até lá.
A PRIMEIRA
ALEGRIA DO CASAL
Enquanto
faziam planos para essa nova viagem quando para surpresa do casal Maria Rosa
anuncia que está esperando um filho. Essa notícia foi um misto de surpresa e
felicidade. Já havia algum tempo que os dois desejavam tanto essa criança que já
haviam até desistido de esperá-la. Mas eis que ela resolve aparecer.
Os nove meses
que se sucederam foram todos dedicados a preparar a casa para receber o novo
morador.
Durante as
noites ficavam tentando adivinhar se seria menino ou menina. As mudanças no
corpo da mulher já podiam ser vistas.
A barriga
crescia a cada mês. O período de enjôo não foi muito. E Maria Rosa estava sempre
disposta.
Mas quando se
aproximava o dia da criança nascer, os trabalhos de casa já não podiam ser
feitos com a mesma disposição.
Numa manhã do
mês de julho de 1958 vinha ao mundo uma linda menina, nas instalações do
hospital da Fundação aqui mesmo em Xavantina.
Foi batizada
com o nome de Vitória, numa homenagem à vitória alcançada pela expedição
Roncador-Xingu, que conseguiu atingir muito além das metas estabelecidas quando
de sua criação.
E o final do
ano de 1958 foi todo dedicado à nova companhia do casal.
O TRABALHO NA
CHÁCARA
O trabalho no
almoxarifado já não era tão intensa como no começo. Os funcionários da expedição
Roncador-Xingu, quando esta foi extinta, haviam passado para a Fundação Brasil
Central e, João de Deus, com essa mudança, passou a dedicar seus dias em cuidar
de uma pequena chácara que havia ganho nas proximidades de Xavantina, como
prêmio por todo seu trabalho como expedicionário pioneiro.
A chácara, de
uns quatro hectares, ficava às margens do córrego Mortinho. Todos os dias,
depois de cumprir suas tarefas na casa da chefia, dirigia-se para seu pedaço de
terra e nele trabalhava bastante. Primeiro desmatou um bom pedaço, depois
plantou algumas mangueiras, um hábito por aqui, pois é uma árvore que em poucos
anos está dando bons frutos, e também alguns pés de laranja. Preparou um outro
pedaço da terra e plantou um mandiocal, do qual retirou farinha quase todos os
anos.
Quando era
época de colheita, toda a família ia para a chácara. Lá ele construiu uma
pequena casa coberta de palha e de paredes de pau a pique, técnica que conheceu
quando ainda estava em sua terra natal.
O córrego
sempre foi perene e ele se utilizava de suas águas para produzir outros
alimentos como o arroz, o feijão e o milho.
O arroz era
plantado depois que o período das chuvas se iniciava, lá pelo mês de novembro.
Já o milho, um pouco mais tarde. Mas o que ele gostava mesmo era de plantar o
feijão fora de época, pois podia irrigá-lo. É que sua chácara, assim como a de
outros colegas era cortada por um pequeno desvio do córrego, que corria
estrategicamente pela encosta da barranca que se acentuava muito com a descida
do carrego a partir da nascente.
Com esse
"rego", conseguiram, em uma distância de 500 metros, um desnível de uns dois
metros mais ou menos em relação ao leito original do carrego e uns 50 metros de
largura entre eles. E era nesse espaço que ele colhia seu feijão.
Como havia
espaço, construiu um chiqueiro, que sempre tinha porcos na engorda. Com isso
conseguia banha barata para cozinhar e vez por outra, em dia de festa, uma carne
de porco para ajudar.
Conforme a
tempo passava, o apoio direto da Fundação Brasil Central aos seus funcionários
aqui destacados, passou a ser menos intenso.
Havia
necessidade de que aqueles que aqui moravam, complementassem, com produção
local, o abastecimento de suas dispensas.
Isso mantinha
todos ocupados.
Não havia
energia elétrica ainda, e de equipamentos modernos somente algumas geladeiras
movidas a querosene.
E João de
Deus não era um desses privilegiados.
A REBELIÃO DE
ARAGARÇAS
O ano de 1959
passaria como outro ano qualquer, não fosse o episódio da rebelião de alguns
oficiais da Força Aérea Brasileira baseados em Xavantina e Aragarças.
Os motivos
que levaram esses oficiais a um ato tão extremo, João de Deus não pôde
compreender bem, mas esse episódio fez com que as autoridades do governo federal
voltassem novamente a dar integral apoio para esta região.
Todas as
atenções do presidente Juscelino Kubitschek estavam voltadas para a construção
da nova capital, e a região recém desbravada, havia ficado em segundo plano.
VISITANDO
BRASÍLIA
Em 1960, João
de Deus, juntamente com sua querida Maria Rosa, resolve visitar a nova capital.
Consegue uma
dispensa temporária da Fundação e embarcam em um avião, com destino a Aragarças,
de onde seguem para Goiânia.
Puderam ver
como a cidade havia se transformado desde a ultima vez que lá estiveram.
Ficaram uns
três dias na casa de parentes de um amigo seu, que tentou a sorte num dos
garimpos de diamante em Barra do Garças. Era uma família de maranhenses, muito
simpática e acolhedora.
Seu Tenório,
o chefe da família, se prontificou em os acompanhar nessa visita ao local onde
estavam construindo a nova capital.
Seu Tenório
tinha amigos que trabalhavam no transporte de materiais de construção para
Brasília. Ele conseguiu uma carona em um dos caminhões da transportadora.
Depois de
passar um agradável final de semana com aquela família, ele, sua esposa e seu
novo parceiro de aventuras, partiram para Brasília.
A estrada,
muito movimentada e por isso com muita poeira, passava por Anápolis, naquele
tempo uma pequena cidade. Fizeram o pernoite lá. No dia seguinte, bem cedo,
depois de um cafezinho, partem para a capital.
A viagem,
embora demorada, não teve qualquer problema. Só os assustava um pouco, o grande
movimento de caminhões e máquinas de todos os tipos.
Como o
caminhão no qual estavam devia fazer a entrega e depois iria para o garagem da
companhia, seguiram com ele até o local da entrega e de lá pediram que ele os
levasse para uma pensão, onde hoje fica o núcleo Bandeirante.
Depois de um
bom banho, saíram para conhecer a noite. O movimento era grande. Podiam observar
que haviam homens das mais diversas regiões do Brasil. Parecia uma reprodução
ampliada mil vezes daquilo que um dia foi a expedição Roncador-Xingu.
As casas,
todas de madeira, mostravam um grande acampamento. Paulistas, mineiros, goianos
e principalmente homens do nordeste compunham aquela massa humana que vivia ali.
Entraram em
um restaurante para jantar. O prédio também feito de madeira, estava cheio.
Deviam ter umas cinqüenta mesas espalhadas por um amplo salão iluminado. O
cheiro de comida no ar, despertou ainda mais a fome. Sentaram-se e pediram a
refeição. Enquanto comiam, puxaram conversa com alguns homens que estavam na
mesa ao lado. Depois de se apresentarem, buscaram informações de como poderiam
visitar as obras da grande cidade.
Foi aí que
perceberam que estavam efetivamente dentro de uma grande, uma enorme, uma
gigantesca construção. A cidade inteira era o canteiro de obras, e para poderem
andar por ela, tinham que ter autorização ou então estar em um dos veículos
autorizados a entrar. Só transitavam por ela os carros das construtoras, as
máquinas, os caminhões que traziam material para as construções ou os ônibus
destinados ao transporte dos empregados.
Decidiram que
na manhã seguinte iriam procurar novamente o amigo, na transportadora, para
tentar uma forma de visitar mais de perto as construções.
E na manhã
seguinte lá estavam os três. O amigo os apresentou para os responsáveis pelo
escritório da companhia e acertaram uma ida ao canteiro das obras num carro
pequeno do escritório.
Logo que
chegaram João de Deus e Maria Rosa não conseguiam entender o que estava
acontecendo.
Um vasto
descampado, um enorme espaço de terra nua, toda remexida, surgiu diante de seus
olhos. Aqui e ali um esqueleto de prédio em construção, mais além uma grande
estrada sendo aberta. E em todos os locais onde havia uma construção, fervilhava
de homens, carros e máquinas por todos os lados. Esses eram os candangos, como
eles mesmos se autodenominavam.
Um movimento
de máquinas que nunca tinha visto, nem nas derrubadas que abriram a estrada que
ele junto com seus colegas de expedição haviam aberto entre Barra do Garças e
Xavantina.
Seu primeiro
sentimento foi de um vazio total. Teve a impressão de perder todas as
referências. Conforme andavam por entre aquela loucura total, Adriano, o
motorista do carro, tentava lhes explicar que em determinado lugar seria o Eixo
Monumental, que em outro seria um prédio residencial, que naquele outro seria a
rodoviária, mais a frente seriam os ministérios, adiante o Palácio do Planalto,
o hospital, os prédios comerciais. Mas a única coisa que conseguiam ver era a
confusão geral. Não compreendiam nada.
Adriano
desistiu de tentar explicar e ficou apenas observando as reações do casal.
Ao chegarem
em frente de um prédio, Adão contou que um daqueles caminhões que transportam
concreto, havia atolado bem em frente, mas que devido aos grandes aterros que
estavam sendo feitos, cada vez que tentavam tirar o caminhão do atoleiro, mais
ele afundava na terra molhada e solta. Foram tantas as tentativas que em um
determinado momento o caminhão que insistia em permanecer ali, estava atrasando
os trabalhos. Como as multas por atraso eram altas, os engenheiros decidiram
enterrar ali mesmo o caminhão.
Isso era
demais. Enterrar um caminhão? Eram loucos. Mas o certo é que havia todo o tipo
de construção possível e imaginável. Pontes, viadutos, desvios, num traçado que
parecia que ninguém sabia realmente o que estava fazendo ou onde queria chegar.
Foram até o
local onde estavam sendo construídos os prédios dos ministérios. Pareciam
gigantes perfilados, lembrando o dia em que os expedicionários, de enxadas nos
ombros, como se estivessem carregando fuzis, postaram-se ao lado da pista de
pouso de Xavantina, no dia em que pousou o primeiro avião com autoridades em
visita.
Ao fundo,
erguia-se um prédio alto, com duas conchas estranhas de cada lado. Parecia uma
construção enterrada no chão. Adriano disse que ali seria o Congresso. Um dos
lados para o Senado e o outro para a Câmara dos Deputados.
Visitaram a
construção da Catedral, que já estava bem adiantada. Também era uma construção
com parte enterrada no chão. Diferente. Tudo novo. Nada daquilo que ele conhecia
se comparava àquelas construções.
Andaram mais
uns dois quilômetros e foram até o Palácio da Alvorada, onde seria a residência
oficial do Presidente da República. Depois de algumas outras visitas, a tarde já
chegava. Era hora de voltar.
Novamente na
transportadora combinaram a carona de volta a Goiânia.
No dia
seguinte antes de amanhecer, João de Deus, Maria Rosa e seu Tenório já estavam
na estrada, deixando para trás uma monumental cidade.
Um sentimento
estranho no coração, pois não conseguiram entender o que estava acontecendo, o
nascimento da cidade que é hoje, patrimônio vivo da humanidade.
Mas naqueles
dias, uma verdadeira torre de Babel.
Na volta João
de Deus e Maria Rosa aproveitaram a estada em Goiânia para fazer algumas
compras.
Levaram
presentes para a pequena Vitória.
Na chegada,
foi pelo menos uma semana para contarem tudo o que viram. Todos os companheiros
de expedição estavam curiosos, e todas as noites vinham até sua varanda ouviras
histórias daquela que seria a futura capital.
O tempo
passava e 1961 chegava. 21 de abril desse ano foi a data marcada pelo Presidente
Juscelino para a inauguração da nova capital. João de Deus acompanhava tudo pela
rádio.
Enquanto
ouvia as notícias, imaginava o que estava acontecendo, pois esteve lá.
NOVOS VENTOS
SOPRAM
E a
inauguração de Brasília trouxe um impulso muito grande de desenvolvimento para
toda a região Centro-Oeste do Brasil.
Uberlândia,
Goiânia, Rio Verde, Aragarças, Barra do Garças e algumas outras cidades muito se
beneficiaram desse fato.
Mas os fatos
políticos que se sucederam com a renúncia do Presidente Jânio Quadros, se
refletiram em Xavantina.
Os trabalhos
de vanguarda da expedição continuavam na região do Xingu, principalmente no
contato com os índios, feitos pelos irmãos Vilas Boas.
E a vida em
Xavantina continuava sem grandes alterações. João de Deus e Maria Rosa, agora já
estavam com mais dois filhos, Eduardo e a caçula Alzira.
Passou a
dedicar mais do seu tempo para a chácara, enquanto acompanhava os acontecimentos
da revolução de 1964
O fato do
Governo ser militar não alterava nada na rotina de vida de Xavantina. Foi um
período tranqüilo para Xavantina. Pouca coisa acontecia.
Houve um
ensaio de guerrilha no baixo Araguaia entre os anos de 1966 a 1970, mas as
notícias não chegavam a Xavantina.
Apenas as
conversas daqueles que vinham de São Felix do Araguaia, de Luciara ou das
regiões vizinhas é que falavam da existência de um grupo que queria fazer uma
contra - revolução. Não aceitavam o governo militar. Mas muito pouco ficou
sabendo sobre o que efetivamente aconteceu.
No final de
1967 é criada a SUDECO - Superintendência de Desenvolvimento do Centro-Oeste,
que passou a administrar todo o trabalho desenvolvido pela Fundação Brasil
Central.
Os
funcionários da Fundação passaram a fazer parte dos quadros da SUDECO. A sede da
SUDECO era em Brasília. Daí alguns dos colegas de João de Deus se mudaram para
lá.
A PONTE SOBRE
O MORTES
Foi a SUDECO
a responsável pela construção da ponte sobre o Rio das Mortes.
Todos em
Xavantina puderam colaborar nessa construção. João de Deus lembra que durante um
certo período auxiliou na construção dela.
Essa ponte
representava para todos a integração definitiva dessa região no contexto
nacional.
O movimento
na cidade já era grande, e a balsa instalada no pequeno porto de Xavantina já
não suportava mais o tráfego intenso.
Essa ponte
foi inaugurada em 3 de dezembro de 1971.
A OCUPAÇÃO
DOS SULISTAS
Foi pelos
idos de 1972 que começaram a chegar os primeiros sulistas na região.
Uma
cooperativa do Rio Grande do Sul havia montado um projeto de colonizarão, que
recebeu o nome de Projeto Canarana. Vieram umas oitenta famílias nessa primeira
leva.
Depois do
Projeto Canarana vieram outros como o Projeto Xavantina, Projeto Água Boa,
Projeto Vale da Serra Azul e muitos outros.
Esses
projetos tiveram alguma dificuldade para deslanchar, pois com o acesso difícil e
as autoridades responsáveis pela regularização das terras não acreditando neles,
essas primeiras famílias passaram muitas dificuldades.
Foram
precisos uns três ou quatro anos para que esses projetos demonstrassem produção
efetiva e provassem a todos que eram viáveis.
Os incentivos
fiscais da Amazônia também deram algum impulso à região.
Mas os
grandes beneficiados eram sempre, os de fora da região.
João de Deus
lembra que apenas a mão de obra de peões e cerqueiros eram contratadas aqui. Os
chefes geralmente vinham de fora e não se fixavam aqui. Vinham, davam as ordens,
programavam as derrubadas, os plantios e logo retornavam.
Lembra que
nesse tempo a pista de pouso de Xavantina tinha um grande movimento de pequenos
aviões. Esses aviões eram geralmente das grandes fazendas que se instalaram
aqui.
No ano de
1975 chegaram os primeiros colonos para se fixarem no Projeto Água Boa.
Passaram por
Xavantina e se instalaram a uns oitenta quilômetros, próximo de um dos
acampamentos instalados pela expedição, na sua segunda fase.
O esquema
desses projetos era o seguinte. Uma área grande de terra era dividida em lotes
de aproximadamente 250 hectares. Uma parte dessa área era destinada a um centro
comunitário onde ficaria a escola, a sede da associação ou cooperativa dos
produtores, uma igreja e outros instrumentos que atendessem aos interesses
daqueles que participavam do projeto.
Esse período
foi de grande importância para toda a região, que passou a receber o apoio da
agência do Banco do Brasil de Barra do Garças.
João de Deus
lembra bem que foram anos de grande produção.
Hoje a região
está completamente diferente daquela época. Existem vários outros municípios
tais como Campinápolis que tinha o nome de Jatobá, o antigo Cocalinho, o
município de Ribeirão Cascalheira, a Querência e tantos outros se consolidando,
crescendo e ajudando os outros a crescerem.
Foi nessa
época também que começaram a freqüentar a cidade um grupo de espiritualistas que
afirmavam ser esta região da Serra do Roncador, a região que irá despontar no
terceiro milênio.
Eram pessoas
agradáveis e que tinham muito desejo de saber a história da fundação da cidade.
Eram também
quase todos formados. E muitos deles passaram a residir em Xavantina, auxiliando
muito nas escolas, pois eram quase todos formados.
Esses membros
da Eubiose, eram conhecidos como o pessoal
do Arabutã, pois alguns deles eram proprietários de uma fazenda às margens do
Rio das Mortes, que tinha esse nome; o mesmo nome do córrego Arabutã que cortava
essa fazenda.
João de Deus
e Maria Rosa tiveram grande satisfação de receber alguns deles em casa, quando,
em 1975, vieram membros da Eubiose de
diversas regiões do país, participar da inauguração de um bonito Templo
construído às margens do grande e majestoso rio das Mortes.
As conversas
nesses dias se estendiam até a madrugada alta, às vezes com uma roda de violão e
muita música.
E João de
Deus gostava de ouvir essas conversas que tratavam de uma nova maneira de ver o
mundo, uma nova maneira de ser, e sentia-se orgulhoso quando o cumprimentavam
por ter sido um verdadeiro bandeirante do século 20.
A EMANCIPAÇÃO
POLÍTICA
Os anos de
1980 trouxeram a emancipação política da Xavantina que João de Deus ajudou a
plantar e fazer crescer, com um carinho todo especial.
Veio o
asfalto, a luz elétrica, a água encanada, o Banco do Brasil, o Banco do Estado
de Mato Grosso e o BRADESCO, e tantos outros melhoramentos que fizeram com que
esta Xavantina fosse outra Xavantina, bem diferente daquela dos idos de 1940.
Hoje é Nova
Xavantina, que em 1980 foi criada com a fusão dos distritos de Ministro João
Alberto (a Xavantina) e Nova Brasília.
João de Deus
se lembra bem de como começou a se formar o pequeno povoado que deu origem ao
distrito de Nova Brasília, na margem esquerda do Rio das Mortes, bem em frente
do acampamento da Fundação Brasil Central.
O acampamento
e as casas dos expedicionários formavam um bloco só. Era como se fosse uma base
militar. Nenhum estranho ficava aqui. Aqueles que usavam a estrada,
principalmente a partir dos anos 70, chegavam a Xavantina e tinham que
atravessar o rio de balsa e pousavam do outro lado. Com isso foram surgindo as
primeiras construções com o objetivo de abrigar os viajantes.
Esse início e
o fato de as terras daquele lado do rio terem parte de seus documentos
regularizados, deu um impulso comercial maior ao então distrito de Nova
Brasília.
Surgiu um
pequeno hotel e diversos bares e um pequeno posto de abastecimento de
combustível do Geraldo Parreira, um motorista que resolveu casar e se radicar
aqui, trazendo com ele os mesmos sonhos que tão bem João de Deus conhecia.
Com a criação
do município, fizeram um plebiscito que deu o nome de Nova Xavantina à união dos
dois distritos.
Mas Nova
Xavantina ainda dependia de Barra do Garças, Aragarças e Goiânia.
João de Deus
teve várias vezes que se deslocar para Aragarças para fazer telefonemas, pois
nem em Barra do Garças isso era possível.
50 ANOS DE
PROGRESSO NO GEO-CENTRO DO BRASIL
Hoje Nova
Xavantina tem vida própria; a energia elétrica, o telefone, as estações de rádio
e de TV local, e elege os seus próprios representantes.
Tornou-se
jovem e independente daquela que durante muitos anos velou pelos seus passos:
Barra do Garças. Hoje, as duas cidades juntas lutam para fazer do Vale do
Araguaia a realização dos sonhos dos antigos pioneiros e desbravadores como ele.
Para João de
Deus o seu sonho de jovem adolescente tornou-se realidade.
Vive com toda
sua família aqui, às margens do lendário Rio das Mortes, que nunca lhe causou
mal algum, ao contrário, sempre lhe deu grandes lições de vida.
---x---
A noite já ia
alta, e naquela varanda a brisa fria vinda do rio, balança os seus cabelos que
se tornaram brancos pelo tempo.
Perdido em
seus pensamentos João de Deus faz uma retrospectiva desses anos todos que já
viveu aqui.
Desde os
trabalhos da primeira turma, da qual participou e que abriu a picada inicial
rumo ao Xingu, desbravando terras totalmente desconhecidas, por um percurso
feito, naquela época, em 87 dias, até hoje, quando se pode fazer esse mesmo
percurso em apenas duas horas.
Daquele 14 de
abril de 1944, até hoje, 14 de abril de 1994, passaram-se 50 anos de muita
história e certamente de muito progresso. Um local onde hoje cresce com tanta
pujança a cidade que um dia povoou seus sonhos de jovem.
Uma mão amiga
toca em seus ombros e o desperta de seus sonhos, pedindo:
- João, vem
descansar, porque amanhã é quatorze de abril e você tem que estar de pé logo
cedo para participar das comemorações do aniversário da cidade.
Essa voz ele
já conhecia bem era de Maria Rosa, sua querida companheira de tantos sonhos e
tantas aventuras!
FIM
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